quinta-feira, 19 de março de 2009

Travessia Gouffre du Burtetch – Grotte du Riusec, França.

A Gouffre du Burtetch fica inserida na região de Ariège, no lado francês dos Pirinéus, que é uma zona recheada de míticas redes de cavernas. Palmilhada pelos grandes exploradores franceses da primeira metade do século XX, é ainda hoje um paraíso para todos os espeleólogos que procuram enriquecer as suas experiências de exploração, pois sente-se no ar a presença desses pioneiros.
A 8 de Junho de 2008, eu, o Pedro Pinto, o Timóteo Mendes e a Sofia Abrantes saímos bem cedo da nossa casa abrigo e percorremos por estrada nacional cerca de 60km até à zona Arbas, aí começamos a subir por um caminho de montanha durante 18km chegando ao fim deste cerca de 1,5h depois. A partir deste ponto equipamo-nos, fizemos a distribuição de equipamentos e com o GPS na mão começamos a subir uma enorme e íngreme encosta até atingirmos a cota de 1510m.
Chegamos a uma clareira onde saltavam à vista duas enormes dolinas e pouco mais ao lado a espectacular entrada da Gouffre du Burtetch.
Um dos nossos objectivos era realizar o levantamento de vídeo da travessia, para isso tínhamos preparado três projectores “caseiros” para a iluminação com três baterias de 12V.

Depois de uma breve pausa para recarregar energias gastas durante a subida, entramos na caverna. Acedemos por uma entrada de 2mx2m com 10m de profundidade seguindo-se logo a grande sequência de poços, alguns com água à qual tivemos de evitar a todo o custo. A temperatura junto à entrada era de cerca de 4ºC e uma possível molha não era nada aconselhável.

Ao fim de umas quatro horas de intensa progressão chegamos à fabulosa grande “Salle A” de Riusec, possui cerca de 150mX100m e as nossas luzes não alcançavam as suas paredes. Realizamos nesta zona uma boa colecta de imagem e ainda houve tempo para fazer uma visita à “Salle Martel” que tem idênticas dimensões.

Seguimos o colector fóssil final que nos levou até à saída, era praticamente noite e, no meio da floresta pirenaica, não foi assim tão fácil descobrir o rumo certo até ao carro, era já noite caída quando o alcançamos.

Já nos preparávamos para voltar quando percebemos que o carro tinha perdido a bateria, eram dez horas da noite e esperava-nos uma caminhada de 18km montanha abaixo até que se conseguisse chegar a algum sitio onde alguém nos pudesse ajudar, caso contrario estávamos a 80km da casa abrigo, cheios de fome, frio e cansaço.

Valeu a todos o engenhocas do Timóteo, com as baterias que tínhamos levado para iluminação na gruta conseguiu por o carro a trabalhar…ufa! Valeu a pena ter um engenheiro por perto!


…passos na história.

● A Gouffre Burtetch foi explorada até -40m em 1934 por Félix e Louis Trombe. Os mesmos, mais tarde, conseguem progredir 110m a partir do nível superior da Grotte de Riusec.

● A 24 de Agosto de 1950 uma equipa militar dirigida por M. Auriol, consegue ligar as duas cavidades realizando assim a primeira travessia.

● A Grotte de Riusec inferior foi explorada em 1934 por Félix e Louis Trombe que realizam também a planta topográfica.

● A junção do nível inferior da Grotte de Riusec com o superior só é conseguida em 21 de Junho de 1963 pelo S.C. Paris.

● Em 1971, o mesmo grupo efectua a topografia do sistema.

● A primeira travessia em rapel é realizada pelo S.C. Paris e pelo Groupe Spéléo Foix a 31 de Outubro de 1971.

Faro de espeleólogo.

Uma história de pedras contada por Michel Bouillon.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Gruta do Frade, Serra dos Pinheirinhos.

A descoberta da mais bela cavidade portuguesa.

Sobre a serra dos Pinheirinhos, na costa de Sesimbra, havia sido detectado um pequeno buraco numa lapa junto ao mar conhecida pela população rural por “lapa do sono”.

A lapa era constituída basicamente por uma galeria abatida onde, debaixo destes abatimentos, havia espaços com formações de grande beleza. Num dos cantos, mais resguardados, havia um pequeno buraco pouco maior que uma mão fechada e de lá saia uma intensidade de ar muito forte, porém, o prolongamento e dureza da rocha que envolvia o buraco era tal que parecia ser impossível ter sucesso numa desobstrução. Valeu o apoio da Câmara Municipal de Sesimbra que nos presenteou com um martelo eléctrico e um gerador.

Durante o mês de Junho de 1999, a equipa constituída por mim, Francisco Rasteiro, João da Luz, Ricardo Mendes e Jorge Ribeiro criou condições para se poder iniciar a ambicionada desobstrução. Foi executada uma tirolesa em cabo de aço que permitiu a passagem de equipamento desde a entrada, junto ao mar, até ao local da desobstrução, foram passados cabos eléctricos por forma a que o gerador pudesse estar na rua e assim evitar o perigo de contaminação do ar por gases.


Durante uma semana fizemos da praia do ribeiro do cavalo, que dista cerca de 500m da gruta, a nossa base de exploração, aí comemos, aí dormimos, aí preparávamos a actividade do dia seguinte e dali saiamos para, determinados, “roer” mais um pouco de rocha.

O mar sempre inconstante, até no verão, fazia com que fosse necessário ficar sempre um de nós de vigia no pequeno barco de apoio, lá dentro, na frente de desobstrução, por vezes nem conseguíamos ver o que se estava a fazer. O pó que resultava da calcite que ia cedendo vinha-nos parar aos olhos, tínhamos de serra-los, ver pelo meio dos pêlos das pestanas porque os óculos de protecção não resultavam, ficavam rapidamente embaciados.

Os dias foram passando e a nossa ansiedade aumentando, lasca a lasca fomos conquistando espaço que nos permitiu descer cerca de um metro, ao fim de uma semana de intenso labor, já no fim do dia, conseguimos espreitar por baixo da estreiteza que tínhamos aberto e vimos um túnel repleto de formações.

A 21 de Junho de 1999 descobríamos um mundo subterrâneo encantado, difícil de descrever por palavras, incomparavelmente o mais belo de Portugal.

Seguiram-se quatro anos de exploração e seguramente os melhores da minha vida. Foram muitos os episódios de “cortar a respiração” à medida que a grandeza da gruta se ia revelando, mas houve um momento que para mim destaco.

Ao fim do terceiro dia de exploração chegamos a uma zona onde a gruta parecia acabar. Num canto, na orientação do colector que estávamos a seguir, havia uma densidade incrível de formações bem desenvolvidas, já nos preparávamos para regressar, quando o Jorge (Rato) por entre a profusão de formações foi tentar espreitar se a gruta continuava e desapareceu. Regressou com os olhos meio esbugalhados e quando lhe perguntamos o que é que tinha visto, respondeu: - épa não sei… é tudo branco!



…passos na história.

29 de Maio de 1996; três elementos da jovem associação de espeleologia, NECA, visita pela primeira um buraco junto ao mar conhecido pela população por “buraco ou lapa do sono”.

Junho a Agosto de 1996; são realizadas várias acções de alargamento de passagens nos cantos e nos abatimentos da lapa da qual resultam o surgimento de alguns espaços com formações de rara beleza.

21 de Junho de 1999; após uma semana de alargamento de um pequeno buraco onde vinha uma forte intensidade de ar, é descoberta a Gruta do Frade.

Novembro de 2001; o Programa Operacional do Ambiente que teve como parceiros o Instituto de Conservação da Natureza e a Câmara Municipal de Sesimbra, aprova um projecto de apoio à investigação espeleológica da gruta e área envolvente designado por “Projecto de Investigação do Sistema do Frade”.
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