Considerações Sobre a Morfologia e
Génese do Património Espeleológico da Arrábida Oriental
A Cadeia da Arrábida é essencialmente
constituída por sequências sedimentares carbonatadas, dolomíticas e margosas
estendendo-se por cerca de 30 km ao longo de uma direção ENE - WSW. É uma
pequena região montanhosa situada na parte meridional da Península de Setúbal e
que corresponde à extremidade sul da Bacia Lusitaniana: é descrita como sendo a
estrutura mais interessante e uma das mais importantes da tectónica de inversão
de idade Miocénica registada nessa Bacia sedimentar (Choffat, 1908). De idade
Miocénica, resultou de dois episódios compressivos principais: o primeiro entre
21,8 - 16,6 M.a. e o segundo entre 8 - 6,5 M.a. (Kullberg et al., 2000).
Depois das forças
internas do planeta pressionarem a massa rochosa e esta emergir, a Arrábida foi sofrendo ações de intemperismo e
de erosão, elementos que, entre outros, esculpiram a paisagem cársica e que por
sua vez, frequentemente, determinam a evolução da paisagem subterrânea em geral.
No domínio da génese e evolução do que hoje é o património
cavernícola do sector Oriental da Cadeia, podemos constatar vários fatores que
terão contribuído para o perfil de carso e endocarso que hoje compõem esta
zona; em regra, o setor oriental da Arrábida é dominado pelo anticlinal do
Formosinho, com cerca de 10km de comprimento, e que está recortado por muitas
falhas e outros acidentes de menor escala (Kullberg et al., 2000). A geomorfologia a que se assiste nas cotas mais
elevadas não favoreceu a formação de zonas aplanadas - a água que à superfície
cinzela formas espetaculares como lapiás parece migrar difusamente em
profundidade condicionada pelos acidentes tectónicos. Nesta zona as grutas
conhecidas estão instaladas preferencialmente nestes acidentes, não evoluem
muito em profundidade, apresentam sinais de carsificação sendo frequentemente
interrompidas pelo colapso e pela colmatação calcítica de blocos rochosos.
Às cotas intermédias, inferiores a 220m, a tectónica continua
a parecer ser o ingrediente base para a instalação do endocarso, no entanto - e
sendo uma forte questão a colocar -, nesta zona serrania há que considerar uma
possível influência dos paleoníveis de mar correspondentes à vizinha Plataforma
de Abrasão marinha do Cabo Espichel, provavelmente formada no Pliocénico,
ocorrido aproximadamente entre os 5,3 e os 2,6 M.a., (Ribeiro et al., 1987).
Dependendo da idade de cada cavidade, durante o processo de transgressão e
regressão, o mar poderá ter tido alguma influência na génese e carsificação do
endocarso através de processos químicos e mecânicos exercidos sobre as rochas.
Não menos importante é o papel que a forte e densa vegetação da Arrábida tem
atualmente no processo de carsificação. A manta morta constitui uma forte contribuição
para o enriquecendo e elevação dos teores de CO² da água, aumentando a sua
acidez, especialmente nos períodos de maior pluviosidade. As cavidades aqui conhecidas
desenvolvem-se em fraturas alargadas pelos processos de carsificação, têm
perfil semivertical e, por regra, são bastante colmatadas por recoberturas calcíticas.
Nas altitudes mais próximas do nível do mar, este aspeto
parece ter sido o principal responsável pela evolução cársica subterrânea,
especialmente na zona entre o Portinho da Arrábida e a Praia de Alpertuche.
Contudo, há também que considerar outro aspeto: as rochas desse troço litoral
são constituídas por Biocalcarenitos, sendo por isso, perfeitamente
carsificáveis. As variações do nível marinho, devido às alternâncias dos ciclos
de glaciação ocorridas durante o Quaternário, terão - através de processos
químicos e mecânicos, conjugados com a carsificação - alargado fraturas e
originado uma particular tipologia de cavernas (M. Telles Antunes, 1993).
Instaladas nessas fraturas, observam-se cavidades isoladas e desenvolvidas,
principalmente, em horizontalidade. Fazendo eco desta conjugação de fenómenos e
representando a notável ação escavadora do mar, existe aí um complexo
cavernícola que parece representar as verticalizações do entalhe basal da
arriba pelo mar. Trata-se da Lapa Verde; uma gruta que se desenvolve ao longo
da linha de costa, com dezenas de salas de várias dimensões e inúmeros poços
cilíndricos - quase uma centena! Todo este conjunto é, com certeza, complexo e
muito raro no nosso País.
Na zona Setentrional da serra, embora as haja em escassos
números, outro perfil de pequenas cavidades ocorre. Sob o imponente esporão
rochoso de Castelo dos Mouros e no Vale de Valongo, duas pequenas cavidades
testemunham e fazem parte do que parece ser o resultado do encaixe destes dois
vales fluviocársicos. Trata-se, provavelmente, de cavidades resultantes da
combinação de fatores cársicos e fluviais.
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